Observação do eclipse solar total de 2 de julho de 2019

Grupo Alfa Crucis

01/11/2019

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Logo nas primeiras reuniões do Grupo Alfa Crucis, um tema que ficou evidente foi o desejo que muitos tinham de acompanhar o eclipse total do Sol que seria visível no Chile e Argentina em 2 de julho de 2019.

Cinco dos integrantes do grupo já haviam presenciado pelo menos um eclipse solar total anteriormente – no Brasil, no exterior ou a bordo de aeronaves. Seus relatos sobre a deslumbrante experiência que é a observação desse tipo de fenômeno ajudaram a motivar o grupo a iniciar o planejamento, que incluiu uma análise pormenorizada dos fatores astronômicos, meteorológicos e logísticos para selecionar o local ideal para observar o evento. Além disso, a proposta impôs a necessidade, para aqueles que desejavam registrar o eclipse, de planejar toda a parte logística referente a definição, uso e transporte dos equipamentos. (Ver nos textos abaixo as ferramentas para o planejamento da viagem e a preparação, técnicas e resultados da observação.)

Eclipses solares totais são fenômenos relativamente raros. Eles ocorrem como resultado da incrível coincidência de o Sol e a Lua apresentarem diâmetros aparentes semelhantes quando vistos da Terra (o diâmetro real do Sol é aproximadamente 400 vezes o da Lua, mas esta se encontra cerca de 400 vezes mais próxima de nós). Ora, esse fato poderia levar à errônea suposição de que deveríamos ter um eclipse solar a cada mês; isso não ocorre, no entanto, em função de dois fatores principais: a órbita da Lua em torno da Terra não é circular, mas sim elíptica, e o plano dessa órbita é inclinado cerca de 5 graus em relação à eclíptica (o plano de revolução da Terra em torno do Sol). Em consequência, o número médio de eclipses solares em geral (parciais, anulares ou totais) é da ordem de 2,4 eclipses por ano. Já os eclipses totais ocorrem com uma frequência média de um eclipse a cada 18 meses.

A faixa de totalidade de um eclipse é delimitada pela projeção da sombra da Lua sobre a superfície da Terra; essa sombra se move muito rapidamente (com velocidade da ordem de 1700 km/h). Assim, a duração da totalidade está sempre restrita a poucos minutos, sendo diferente em cada ponto específico da trajetória da sombra.

Naturalmente, o desejo é sempre escolher um local onde a totalidade tenha a maior duração possível. Do ponto de vista astronômico, isso é fácil de determinar; no entanto, as possibilidades de observar nesse lugar dependerão sempre dos fatores climáticos e logísticos. No caso deste eclipse, por exemplo, a duração máxima da totalidade seria de 4 minutos e 33 segundos – mas isso ocorreria apenas em um remoto ponto do Oceano Pacífico Sul, a milhares de quilômetros da costa da América do Sul e fora de questão por motivos logísticos e financeiros. Um balanço razoável entre duração e logística/custo já começava a acontecer a partir do local em que a sombra da Lua tocava o continente, próximo à pequena cidade de La Higuera, no Chile: eram 2m36s de totalidade. Mas, a este ponto, os fatores climáticos se tornavam absolutamente decisivos. A escolha final – como em todo e qualquer eclipse – é portanto um compromisso entre os três fatores fundamentais (astronômico, climático e logístico, incluindo aqui custos).

As linhas mestras do planejamento efetuado pelos membros do grupo Alfa Crucis durante os primeiros meses de 2018 estão detalhadas nas “Orientações para o planejamento”, abaixo. Após diversas reuniões em que foram estudados aspectos cruciais para a tomada de decisão (a trajetória da sombra da Lua, os tempos de totalidade em diferentes cidades e pontos de observação, as condições climáticas/ meteorológicas, topografia, facilidades logísticas e o custo de cada alternativa), a maior parte do grupo decidiu como destino a região de Vicuña, no vale do Elqui, no Chile. Além de condições excelentes do ponto de vista climático e de uma duração da totalidade bem próxima à máxima em toda a trajetória da sombra lunar em terra firme (em torno de 2 minutos e 30 segundos), Vicuña, pouco mais de 60 quilômetros a leste da cidade litorânea de La Serena, oferecia ainda a vantagem de ser próxima ao Observatório Astronômico de Cerro Tololo, que o grupo tinha a intenção de conhecer.

Por fim, 31 pessoas no total, entre membros do Alfa Crucis, familiares e amigos, viajaram para o Chile. Três outras integrantes do grupo escolheram alternativamente observar o eclipse na Argentina, que também apresentava condições climáticas privilegiadas e duração da totalidade apenas poucos segundos inferior à do Chile.

Paralelamente discutiram-se as estratégias de registro do evento, sendo providenciados os filtros necessários para acoplagem a binóculos, telescópios e máquinas fotográficas. Tais filtros, como se sabe, somente são utilizados nas fases parciais do eclipse, mas não durante a totalidade, em que a coroa do Sol produz uma luz mais tênue que até mesmo a faixa mais estreita de um eclipse parcial. Várias ideias de adaptações e dispositivos foram propostas para permitir a rápida retirada dos filtros, de modo a captar também os momentos das “pérolas de Baily” e do “anel de diamante”, que antecedem e se seguem imediatamente à totalidade, e que também exigem lentes livres de filtros.

É comum haver dificuldades para conseguir hospedagem em épocas de eclipse, e isso não foi diferente em Vicuña, onde mais de um ano antes as vagas em hotéis já tinham se esgotado. A solução foi alugar várias casas próximas à cidade ou já na região de Pisco Elqui, avançando um pouco mais pelo vale do Elqui.

Outra questão a solucionar era o excesso de bagagem devido aos equipamentos, inclusive baterias. Embora powertanks para telescópios não sejam de lítio e possam ser levados como bagagem de mão em aviões, foi necessário chamar um especialista numa das conexões da viagem, a fim de que seu transporte fosse liberado. Para os demais equipamentos, a compra de franquias adicionais de bagagem e a colaboração dos colegas possibilitaram resolver o impasse.

Paralelamente, alguns estudos foram feitos, usando o Google Earth e depois in loco, para trajetos offroad a partir de pequenas estradas de acesso a pontos mais altos na região, buscando alternativas para a observação, de modo a testemunhar toda a duração do eclipse.

Para a captura de imagens, porém, a opção escolhida foi um patamar em um morro vizinho a Vicuña, com acesso fácil por uma das casas alugadas pelo grupo. Entre os que desejavam apreciar o eclipse sem equipamentos, alguns escolheram um dos trajetos offroad, numa área de montanha isolada, próxima ao Observatório del Pangue e de onde se avistam dois grandes observatórios da região: Cerro Tololo e Cerro Pachón.

Ao chegar o dia 2, desde cedo foram feitos testes com as máquinas e filtros, buscando refinar os parâmetros de velocidade e ISO para cada fase do eclipse, ajustando melhor os valores a cada equipamento, a partir daqueles indicados por Fred Espenak em uma tabela disponível em <http://www.mreclipse.com/SEphoto/image/SE-Exposure1w.GIF>.

O dia estava perfeito, não havia uma nuvem no céu.

Após instalar os equipamentos e fazer os ajustes necessários, os astrofotógrafos começaram a fazer as primeiras imagens. Às 15 horas, 24 minutos e 5 segundos, foi captada a primeira imagem a mostrar o disco da Lua se sobrepondo ao do Sol.  Muito gradualmente a paisagem foi ficando levemente mais escura, como num dia nublado. Ao mesmo tempo, a temperatura começou a cair. As cores das montanhas se modificaram e os pássaros começaram a voar em todas as direções.

O arco do Sol foi ficando cada vez mais estreito, e quando finalmente se tornou uma faixa muito delgada todos tiraram os óculos especiais, os filtros das máquinas, e subitamente explodiu a luz do anel de diamante – o último trecho do Sol vislumbrado através de um vale no perfil da Lua, antes de ele se esconder totalmente. A experiência é tão impactante que na lembrança parece ser um instante único, mas as fotos mostram que durou alguns segundos, começando com as pérolas de Baily – trechos mínimos do Sol, que lembram um pequeno colar de luz e dão lugar por fim ao “diamante”, que brilha de modo deslumbrante mas logo desaparece. Assim que ele se apagou, alguns conseguiram vislumbrar a olho nu, delimitando o contorno solar por breves instantes, um anel fino de luz avermelhada – a cromosfera –, imediatamente suplantado pelo brilho da coroa.

O eclipse solar total cria uma espécie de estranho lusco-fusco, em que se consegue enxergar as pessoas ao redor mas tudo fica bem escuro. Embora não chegue a ser um céu noturno, é possível ver planetas e estrelas. Já o próprio Sol se torna um círculo negro, muito mais escuro que o céu, cercado por uma coroa fantasmagórica que brilha, fria e branca, enquanto o horizonte se tinge de poente em todas as direções e o ar esfria sensivelmente.

As luzes da cidade de Vicuña, que se via embaixo, se acenderam. E um rebanho de ovinos que estava no terreno vizinho rapidamente se recolheu.

Embora a sensação seja de uma suspensão do tempo, a totalidade é muito rápida. Mal se tem tempo para fotografar e apreciar todos os seus aspectos – mudanças atmosféricas, no comportamento dos animais, nas cores da paisagem e do céu a diferentes alturas, além da possibilidade de ver estrelas e planetas em pleno dia. Os dois minutos e treze segundos de totalidade aferidos pelas fotografias parecem ter durado muito menos. A emoção dos que presenciam o evento é grande e é preciso muita concentração para realizar todos os ajustes para que as fotografias saiam boas e ao mesmo tempo apreciar o espetáculo único de um eclipse total.

Os instantes voaram – e de repente brilhou de novo um segundo anel de diamante. Pouco a pouco, a Lua saiu da frente do Sol. Na região do Pangue, adultos e crianças observaram a sombra da Lua movendo-se inexoravelmente, supersônica e silenciosa, e, num instante, o deserto voltar a ser inundado pela luz.

Ao final, uma bela surpresa. Já se sabia que não seria possível de Vicuña ver o fim do eclipse parcial – instante conhecido como C4. Mas o que as pessoas não tinham se dado conta é de como seria lindo e especial ver o Sol se pôr recortado pelas linhas de um morro distante com apenas um pequeninho trecho coberto ainda pela Lua – uma visão inesquecível.

A alegria de todos os grupos ao se reencontrar após o eclipse foi enorme, cada um narrando sua experiência. As imagens obtidas ficaram excelentes, permitindo estimar os instantes de início do eclipse parcial e total (C1 e C2), bem como de fim do eclipse total (C3), realizar análises comparativas sobre o formato da coroa e proeminências.

Na Argentina, o grupo reunido em Bella Vista, praticamente no centro da linha da totalidade, também teve a felicidade de contar com um tempo magnífico e pôde aproveitar o privilégio de ver o Sol eclipsado tendo no horizonte a cordilheira dos Andes.

Não há termo de comparação entre a observação de um eclipse solar parcial e a de um eclipse total. Mesmo para os que não dispunham de equipamento profissional foi um divisor de águas em sua experiência como observadores astronômicos. A partir de um planejamento cuidadoso e contando com condições excelentes de visualização do evento, o grupo do Alfa Crucis voltou enriquecido com a experiência de testemunhar o eclipse de 2 de julho de 2019 e entusiasmado para planejar a observação dos próximos.

Participaram da expedição chilena: Alice (3 anos, filha de André e Paty), André Izecson de Carvalho (Alfa Crucis), Aline Lamm, Carmo Cintra, Denis H. Kulh (Alfa Crucis), Dorival da Silva Reis (Alfa Crucis), Fernando Parmegiani (Alfa Crucis, astrofotógrafo), Flávio Cintra (Alfa Crucis), Fred Schinke, Guilherme Vinícius Cavichiolli Prado, Gustavo Lacreta Colonezi, João Urbano, Juliana Giacomini Stenico, Keico Fugita, Lígia Barnabé (Alfa Crucis), Lizangela Almeida (mestre em Astronomia pelo IAG), Luiza (5 anos, filha de André e Paty), Luis Carlos Nascimento “Dino” (Alfa Crucis), Maria da Anunciação Rodrigues “Ção” (Alfa Crucis), Mário Sérgio Souza da Silva “Marinho” (Alfa Crucis), Marizete Rocha da Silva, Max (4 anos, filho de Tavinho e Aline), Michelli, Monica, Patricia Aguiar (Alfa Crucis), Paty Bortoli, Paula Sanci Camargo (Alfa Crucis), Renata Treü (Alfa Crucis), Renato Luiz Lopes da Silva (Alfa Crucis), Sergio Gonçalves Silva (Alfa Crucis, astrofotógrafo), Tavinho Costa.

Participaram da expedição argentina: Camila Sayuri Vasconcelos Shibata, Daniela Frabasile, Maria Eduarda Frabasile (Alfa Crucis), Ester de Campos Olim (Alfa Crucis), Lilian Pera (Alfa Crucis), Luziane Guinski Chaguri (CASP), Susana Sandes Ramos, Vitor Moraes.


Orientações para o planejamento

Tasso Napoleão

Caso o leitor pretenda planejar sua própria expedição para observar um eclipse solar total no futuro, recomendamos as seguintes ferramentas:

  1. Para os fatores astronômicos, é absolutamente essencial o uso do website do veterano astrônomo norte-americano Fred Espenak, que pode ser acessado em <http://www.eclipsewise.com/eclipse.html>. Espenak trabalhou por três décadas no Goddard Space Flight Center, da NASA, e é considerado o maior especialista mundial em previsões de eclipses. A partir desse site, poderão ser avaliadas as circunstâncias locais de qualquer eclipse (Espenak é o autor do monumental Five Millennium Canon of Solar Eclipses: -1999 to +3000, que fornece mapas e detalhes de todos os eclipses solares desse período de cinco mil anos).
  2. Especialmente útil para os fatores astronômicos é o uso dos dados obtidos no website de Espenak em conjunto com o conhecido freeware Google Earth (<https://www.google.com.br/intl/pt-BR/earth/>) e com um dos arquivos KMZ desenvolvidos especialmente por Xavier Jubier para uso com o Google Earth (e que cobrem todos os eclipses até o ano de 2100). Os arquivos de Jubier podem ser baixados em <http://xjubier.free.fr/en/site_pages/SolarEclipsesGoogleEarth.html>. Com o uso das três ferramentas acima, o leitor poderá escolher o local ideal para sua observação (com precisão de metros) e estudar o relevo e topografia locais e até os meios de acesso, e terá à sua disposição todas as circunstâncias astronômicas do eclipse no ponto exato que escolheu.
  3. Falta, no entanto, analisar em conjunto os fatores climáticos. Embora isso seja possível através de vários websites meteorológicos, recomendamos em especial a consulta ao site do meteorologista canadense Jay Anderson, outro aficionado por eclipses, em <https://eclipsophile.com/>. Para cada um dos eclipses da próxima década, o leitor poderá encontrar mapas climatológicos e previsões médias para cada região coberta pela trajetória da sombra lunar.

A aquisição de imagens de um eclipse solar total

Texto e fotos: Sergio Gonçalves Silva

Planejamento

O eclipse solar é um evento que, do ponto de vista de aquisição de imagem e dados, é diferente de qualquer outro tipo de astrofotografia (céu profundo, planetárias, ironicamente até solar e lunar) e representa um desafio tanto logístico quanto de execução, principalmente durante a totalidade. A pequena faixa geográfica que permite a observação da totalidade obriga ao deslocamento de pessoas e equipamentos, o que implica custos e atenção a regras de entidades como o país a visitar, companhias aéreas e outras condicionantes do local (vacinas, alimentação, terreno etc.). Além disso, o curto espaço de tempo entre os contatos C2 e C3, assim como a pouca experiência instrumental, obrigaram a atenção redobrada e investimento em testes de equipamento e muita pesquisa em publicações de pessoas que tenham tido sucesso na hora de fotografar um eclipse solar total.

O eclipse pode ser dividido essencialmente em três momentos:

T1 = Parcialidade 1 (entre C1 e C2)

T2 = Totalidade (entre C2 e C3)

T3 = Parcialidade 2 (entre C3 e C4)

Conhecendo a duração do eclipse, a elevação do Sol durante o acontecimento e o terreno onde vai ser feita a observação, é possível planejar a captura dos três momentos supramencionados e criar uma checklist:

  1. Definir objetivos: em função do local escolhido, podem todos os pontos de contato ser capturados? No nosso caso existiam dois locais, o de mais difícil acesso permitia a captura do ponto C4, o local secundário, de logística mais simples, não permitia a observação do mesmo.
  2. Definir o equipamento: qual o equipamento mínimo necessário para a captura? Aqui escolhi, dentro do meu estoque de equipamentos, os que me permitiam ter: tracking, FOV de pelo menos 2 graus (ou 4 raios solares, pois a coroa se estende bastante), autonomia energética de pelo menos o tempo de C1 a C4 mais 30 minutos.
  3. Identificar o local com antecedência: para tanto, uma ferramenta como o Google Earth é de valor incalculável. Permite fazer o scouting pessoalmente nos dias que antecedem o evento e ter uma noção real da viabilidade do local, acessibilidade com o peso e quantidade de material escolhido e outras condições como a presença do grande público, que pode ser muito perturbadora. Um local que se preveja com pouca afluência é necessário.
  4. Flexibilidade instrumental: isso é importante principalmente na primeira vez que se fotografa um eclipse, e por isso levei duas câmeras de tecnologias diferentes, uma CMOS refrigerada e uma DSLR, assim como um tripé fixo e uma montagem equatorial GoTo. Além disso, cabos, baterias e adaptadores extras.
  5. Definir a prioridade: desde logo deu para entender que fazer double booking com dois setups diferentes em simultâneo e ainda apreciar o evento visualmente é algo incompatível. Se nossa prioridade é (e deveria sempre ser) a experiência visual, devemos estar preparados psicologicamente para abortar a captação de imagens e priorizar a observação visual.
  6. Roupas e alimentos: durante as horas da captura há variações de temperatura que requerem indumentária adequada ao local. No caso de Vicuña, a poeira e o terreno acidentado também exigiram calçado adequado, proteção contra o calor e o frio. Hidratação é mandatória, então uma garrafa com água é uma boa ideia, assim como um banco portátil para sentar confortavelmente.
  7. Testes: testar o equipamento e ensaiar foram elementos importantes, pois graças aos testes tomei a decisão de usar a DSLR em vez da CMOS, que é demasiado sensível e saturava mesmo com o uso do filtro. Também foi durante essa fase que testei o bracketing como técnica de captura da totalidade e defini os esquemas de captura. É importante também nesse momento sincronizar o relógio do laptop com um NTP pela internet.

Equipamento

Em função do planejamento optei por usar:

  • Telescópio: Zenithstar 71 APO Doublet da William Optics
  • Redutor focal: William Optics 0.8X redutor e corretor
  • Câmera: Canon EOS 50d
  • Razão focal: F/4.2
  • FOV: 4.6 graus
  • Filtro: Baader solar
  • Montagem: Celestron CG5-GT
  • Baterias: Celestron PowerTank + iOptron CW Battery, bateria extra para laptop
  • Tripé: Alumínio leve
  • Laptop com SW: Astrophotography Tool (APT) e iPhone com app: PS Align Pro

Técnicas de observação

  1. Definição de planos de captura: O primeiro desafio foi definir as diferentes exposições necessárias para T1, T2 e T3. O aplicativo APT permite definir planos de execução automatizada, o que possibilitou criar dois planos (X e Y), um para T1 e T3, outro para T2, que seriam manualmente disparados no momento certo.

Plano X: Durante T1 e T3 (de acordo com os testes) as condições de luminosidade eram idênticas, requerendo o filtro solar colocado o tempo todo. Uma das primeiras regras para minimizar o risco de falhas é diminuir o número de variáveis no sistema. Neste caso, as variáveis são: tempo de captura e ISO. Decidi definir o tempo de captura em função de um ISO fixo em 200. Esse valor é semiarbitrário, pois um ISO baixo introduz menor ruído térmico no sensor óptico. O valor para exposição foi então de 1/2500s, escolhido em função dos testes.  O Plano X de imagens para os momentos de parcialidade foi de 1 imagem a cada minuto por tempo indeterminado (pois o final do plano seria acionado manualmente).

Plano Y: T2 tinha duração prevista de pouco mais de dois minutos. Durante esse tempo é necessário capturar o máximo possível do range dinâmico disponível.  A modalidade necessária para tal é de HDR (high dynamic range), que consiste em uma série de exposições SEM FILTRO de duração variável, com a maior cadência possível. Essa técnica é conhecida como bracketing. Obviamente, não foi possível testar… (requer um eclipse total, não disponível em laboratório), pelo que me apoiei em tabelas existentes publicadas por fotógrafos experientes e na minha intuição instrumental.  Mais uma vez, mantendo o ISO em 200, as exposições em HDR para o Plano Y foram:

1/10000 s;  1/5000 s;  1/1250 s;  1/300 s;  1/75 s;  1/20 s;  1/10 s;  1/5 s;  1 s

com uma cadência de 4 segundos entre si, com fim indeterminado, pois a paragem seria manual. O valor de 4 segundos é ele também pseudoarbitrário; tomei em consideração o tremor no sistema causado pelo obturador mecânico da DSLR e optei por esses segundos para eliminar qualquer vibração.

As imagens foram feitas com uma cadência de 1 minuto durante a parcialidade, começando instantes antes do horário estimado para o primeiro contato (C1).

  1. Execução: Foi a parte mais simples, porém a mais intensa… Com tudo decidido, preparado e estudado, bastou subir o equipamento ao ponto de observação definido. No caso, foi escolhido o local que não permitia a captura do C4, uma vez que a quantidade de equipamento, seu peso e a distância a pé acrescentavam risco desnecessário para a primeira observação. Por isso mesmo, os resultados apresentados não contemplam a cronometragem do quarto contato. Segue a execução passo a passo:
  • Chegar ao local (com a ajuda de amigos para carregar o material), escolher um ponto em que o tripé ficasse firme e a estação com o laptop e banco a distância confortável.
  • Montar os equipamentos e fazer o balanceamento e o alinhamento polar (aproximado) usando o PS Align Pro.
  • Aguardar até uns minutos antes do momento esperado para o C1 para lançar o Plano X.
  • Usando filtro visual, esperar até 1 minuto antes do momento esperado para o C2, a 30 segundos de distância retirar o filtro, parar o Plano X e começar o Plano Y.
  • Assim que o eclipse passe o C3, colocar o filtro solar, parar o Plano Y e voltar ao Plano X para capturar o máximo possível da parcialidade na saída.
  • Pelo meio: Desfrutar dos dois minutos de espetáculo da natureza, abraçar os amigos, chorar, gritar e memorizar todas as sensações e emoções.

 

Resultados

  • C1: Entre 15:23:02 e 15:24:05, horário estimado: 15:23:34.

Amostras abaixo: imagens obtidas em 15:23:02 (esquerda) e 15:24:05 (centro e detalhe na direita).

  • C2: Entre 16:38:41 e 16:38:49, horário estimado: 16:38:45.

Amostras abaixo: imagens obtidas em 16:38:41 (esquerda), 16:38:45 (centro) e 16:38:49 (direita).

  • C3: Entre 16:40:53 e 16:41:03, horário estimado: 16:40:58.

Amostras abaixo: imagens obtidas em 16:40:53 (esquerda) e 16:41:03 (direita).

Análise de imagens

Ausência de manchas solares, o disco solar apresentou-se uniforme.

Presença de cinco grandes proeminências, duas delas apresentando forma de loop magnético fechado.

A coroa apresentou um formato alongado, porém de extensão menor quando comparada à das imagens recolhidas durante o eclipse nos EUA em 2017, estendendo-se aproximadamente 1 grau em cada direção.

Morfologicamente a coroa se apresentou simétrica, acentuada em torno ao equador solar, indicando baixa atividade. Muito menos caótica que em anos anteriores.

Observam-se também as Baily’s beads, fenômeno que ocorre com a passagem de alguns feixes de luz solar entre os vales e montanhas das crateras na Lua.

Lições aprendidas

Do ponto de vista instrumental, o equipamento utilizado, embora adequado para a observação e tendo entregue um nível de resolução, qualidade óptica e acompanhamento ótimos, foi um desafio logístico, desde o transporte nas viagens, em especial no caso das baterias, até o transporte manual ao local de observação. Numa próxima observação será melhor preterir o telescópio APO em favor de uma fotolente de entre 70 e 80 mm de abertura, com razão focal entre F/2 e F/4, mantendo a câmera DSLR, que se mostrou ótima. Mantém-se também a presença de um laptop e um tripé leve mas robusto, que permita a utilização de uma montagem mais portátil. A portabilidade e acima de tudo a necessidade de um total de quatro baterias (duas para o laptop, uma para a montagem, uma para o restante do equipamento) torna o processo mais complexo.

É nítido que no momento do eclipse o Sol se encontrava numa fase de atividade baixa, indicada não só pela ausência de manchas solares mas também pela menor extensão da coroa.

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